Janilton Gabriel de Souza*
Se Einstein e Freud vivessem em nossa época, certamente replicariam a conversa por carta que tiveram em 1932. Evidentemente, com a roupagem de nosso tempo: em vez de carta, por WhatsApp ou e-mail. Provavelmente, Einstein iria perguntar sobre o contexto de intolerância em voga no mundo ou, mesmo, sobre os próximos capítulos da história do Brasil.
Entre os dias 30 e 31 de agosto em Belo Horizonte, na Universidade Federal de Minas Gerais, nos reunimos para a segunda edição do Colóquio Internacional de Direito e Psicanálise, que teve como tema: “Adolescências e Leis em tempos de guerra”. Retornei dessa viagem, ao final do domingo e assisti junto com o mundo à perda de um dos maiores patrimônios da humanidade, o Museu do Rio de Janeiro. Ainda na semana, houve uma ampla cobertura da facada ao candidato Bolsonaro. A violência e as tragédias, como sempre tem sido, não saem das capas de jornais. Semana difícil.
Viajo novamente, dessa vez para dialogar outra face da humanidade, menos trágica e mais simbólica, traduzida em palavras. Vou apreciar um dos maiores eventos de flores do país em Holambra, São Paulo. É desse percurso que extraio algumas reflexões, que iniciam com o que escutei no Colóquio Internacional, que reuniu psicanalistas de diversas regiões do Brasil e do mundo, além de antropólogos, sociólogos, operadores do Direito e educadores. Esses profissionais atuam com o impossível, como nos lembra Freud ou ainda, como um dos professores mencionou: “aqueles que atuam onde a sociedade ameaça se desfazer” (Pereira, 2016, p. 207). Essa atuação é sempre balizada com a angústia de não existir receitas prontas e, mesmo que algumas dessas ciências operem com o diverso, esbarram no singular e nas idiossincrasias de cada humano.
Por que a sociedade vive perenemente a ameaça de ser desfeita? O próprio Freud esboçou suas respostas a Einstein (Por que a guerra?, 1932), ao propor que as comunidades mantêm-se unidas através da força e pelos vínculos emocionais (identificações entre os membros). Somado a isso, o ser humano possui em si duas forças (pulsões) antagônicas: uma pulsão erótica (preserva e une) e outra a pulsão de morte (agressiva e destrutiva). Ambas são importantes. Não podemos eliminar a pulsão de morte (agressão e destruição), até porque ela cumpre um papel de desligamento de investimentos anteriores, como ocorre no fim de um relacionamento, além de estar presente em certas transgressões que levam a invenções.
Volto às minhas viagens, pois dialogam com Freud e Einstein, que questionam: o que tornaria alguém pacifista? Assim como psicanalista e o físico, aposto na palavra como ferramenta de avanços e enfrentamento do conflito, a humanidade só possui dois caminhos para lidar com a força (pulsão) em cada um: através da palavra (simbólico) ou da falta dela, ou seja, através da violência. Nesse sentido, Freud é certeiro ao dizer: “Tudo o que favorece o estreitamento dos vínculos emocionais entre os homens deve atuar contra a guerra”.
O sofrimento do sujeito costuma ser acompanhado do afastamento social, que pode ser prejudicado pelo aumento do conflito do sujeito, conjugado às respostas agressivas e violentas. Quando a palavra falta, a violência toma cena. A resolução via violência amplia os atos agressivos. O pacto social não sobrevive se não for sustentado pela palavra, que se encontra na cultura.
Nesse sentido, Holambra aposta nas singularidades. Meus olhos se encantaram com as particularidades de cada flor. Fico admirado de ver a gentileza das pessoas na Exploflora, apesar do aglomerado de visitantes, no dia. Em vários momentos exibiam danças, apresentações musicais e toda uma tradição holandesa narrada. Talvez, nesse espaço, a violência não ganhe terreno, afinal, a própria beleza (quer das flores, quer da cultura holandesa) é traduzida em palavras, como nos cantava Vinicius de Moraes: Entre as prendas com que a natureza / Alegrou este mundo onde há tanta tristeza / A beleza das flores realça em primeiro lugar / É um milagre / De aroma florido.
(*) Psicólogo e Psicanalista. Professor universitário, Unis-MG. Mestre em Psicologia (Psicanálise) pela Universidade Federal de São João Del-Rei. Especialista em Teoria Psicanalítica. Colaborador do Jornal Folha de Varginha e Blog do Madeira. Editor do site Janilton Psicólogo (www.janiltonpsicologo.com.br). Coordenador do Núcleo de Pesquisas e Estudos em Psicanálise, Interfaces. Contato para atendimentos psicológicos (35) 3212 6663 / 99993 6663.
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