Amarildo Serafim e Janilton Gabriel de Souza*
Nos últimos dias usuários das redes sociais, especialmente, do Facebook e twitter produziram uma enxurrada de comentários, que tiveram inicio a partir da fala pinçada do pai de Luiza: “menos Luiza que está no Canadá”, em uma propaganda. Além desses comentários pudemos acompanhar a crítica ostensiva, a favor e contra, que foram apresentadas como: “já fomos mais inteligentes”. O problema é que atribuir falta de inteligência pra um fenômeno que mobilizou o pais é pormenorizar a questão que está sub-implicada nessa onda chamada “Luiza”. Confrontar a frase sem nenhuma explicação, apenas com uma crítica moralista e sem embasamento não lança a luz que o caso merece para se tornar compreensível. Por isso nos dispomos a levantar hipóteses que ajudem a compreender melhor a extensão da disseminação disso nas redes sociais e na mídia.
Parece uma ausência de sentido quando nos perguntamos, por que uma frase como essa mobilizou tanto as pessoas, uma frase que aparentemente não diz nada? Mas, um elemento que mostra uma face aparentemente insignificante não deve passar despercebido, já que por trás disso que não parece consciente em nós no primeiro momento pode revelar questões intrigantes.
O Marketing se utiliza do recurso de exibir o protótipo da família tradicional e idealizada de um pretérito próximo. Trata-se, então de uma imagem, um ideal inflacionado que trás escrachado uma noção de felicidade, no mínimo questionável, uma vez que a família perfeita não existe, é um ideal sustentado pela mídia, que vende por meio de imagens.
Outro ponto ao qual podemos creditar tal repercussão é a inscrição da filha no discurso do pai. O alvoroço que se criou pela identificação em massa por um lugar no desejo do outro, um grande-outro garantidor. Não que as pessoas quisessem estar na condição da Luiza, propriamente dita, mas cada qual evocou sua significação faltante de ausência ou saudade de lá estar localizado. O Tom jocoso das manifestações apenas mascaram a necessidade de sentir-se lembrado, mesmo que seja em discurso, no desejo de um pai.
Seguramente essa frase que foi tomada por muitos, diz de uma Lei simbólica, sob a qual fomos chamados a responder. Essa frase que se repetiu tanto nas redes sociais nos leva a uma outra questão, quais serão as frases ou melhor palavras (significantes) que governam a sua vida? O que será que você vem respondendo, sendo ou acreditando ser ao longo de sua trajetória? Talvez não cheguemos a uma clara definição de tal repercussão, mesmo porque onde cada um sentiu tocado só ele pode dizer.
É uma questão singular expressa de maneira plural pegando carona na onda, pra evitar mostrar-se o limitado sozinho. Pode ser que muitos só tenham aproveitado disso para tentar fazer um humor, mas sem dúvidas, uma parcela considerável se identificou com toda proposta idealiza de felicidade não no comercial em si, pois as pessoas nem se lembram o nome do empreendimento que divulgava, mas da fala destacada que possibilitou dar vazão a enxurrada de conteúdos inconscientes, pitorescamente disfarçados.
Ainda em tempo vale dizer que o discurso do pai é marcado pela falta, a falta de Luiza. Mesmo querendo transparecer o modelo idealizado não se deixou de lamentar a ausência sentida que não deixa o sonho de ter uma moradia própria ser completa; “a Luiza que está no Canadá” faz ecoar nosso desejo de sermos tão importantes para alguém, sobretudo para nossos pais e, no entanto, sermos só amados como de fato fomos. Pouco ou muito, cada qual que dê a isso o destino apropriado.
Amarildo Serafim, psicólogo da Prefeitura de Carvalhópolis, atende em seu consultório particular em Varginha e escreve seu blog: amarildoserafim.blogspot.com
Janilton Gabriel de Souza, psicólogo atuante a partir da psicanálise, educador e pesquisador. Especializando-se em teoria psicanalítica e mestrando em psicologia. Atende em seu consultório particular em Varginha. (35) 3212 6663 / 9993 6663
Texto originalmente publicado no Jornal Folha de Varginha e também disponível em:
Sem Comentários