Janilton Gabriel de Souza (*)
Inventamos um tempo para, simplesmente, acreditar na renovação de nossas energias. Aliás, nessa época, acendemos as luzes de fora num momento em que as de dentro parecem estar se esvaindo. Reunimos pessoas que ficaram distantes o ano todo e para quem nem sequer havíamos lembrado de telefonar.
As festas de fim de ano são interessantes, pois trazem a ideia de que mais um ano passa sem que tenhamos feito algo que queríamos. Mais ainda, o término dos papéis do calendário parece nos lembrar de nosso fim. Talvez por isso muitos se apressem em querer resolver e fazer o que não fizeram em um ano.
Essa época traz uma divisão entre a vida que gostaríamos de viver e a que vivemos até aqui. Mais do que isso, o fim do ano nos traz a renovação de nossas ilusões: esperamos que no ano seguinte todos os sonhos se realizem e que tudo seja diferente. Desconfio, pois as folhas de nossos calendários mudam mais rápido do que nós. A prova pode estar na repetição de promessas, que fazemos a cada virada de ano. Vão-se os calendários e ficam as promessas de mudança. Por que será que é tão difícil mudar?
Essa foi a pergunta de nosso leitor, Lauro Cezar Santiago Sarto. Ele arrisca a dizer que somos acomodados. De certa forma, ele se aproxima da resposta. Nosso comodismo é fruto de uma “satisfação”, a qual sempre queremos repetir. Embora, na maioria das vezes, as pessoas sofram por essa satisfação, dela não abrem mão facilmente, pois, também, nos satisfazemos na queixa e lamentação de uma vida ruim.
Os papéis dos calendários mostram um movimento de transformação, leve e flexível. Os papéis dos calendários atestam a passagem do tempo sem demora ou arrependimentos. Quem dera fôssemos assim. O fim de um tratamento psicanalítico nos leva a um movimento novo, capaz de saborear cada dia e vivê-lo como se fosse o último. Para isso, não desejamos que nossos clientes sejam “pacientes”, mas “impacientes” com aquilo que os leva a fazer sempre do mesmo jeito. Uma aluna de nosso grupo de estudo em psicanálise disse: “gente que come a mesma comida, sem se dar a chance de experimentar uma nova”. O novo implica a ausência de certezas, que sem dúvidas é uma ameaça para quem nada quer perder e tudo quer controlar. Nossos analisandos (pacientes) começam a ficar bons quando as ilusões de mudança radical, como a de uma promessa de ano novo, cedem lugar à questão: para que tudo isso lhe serve? É diante dessa pergunta que algumas exigências podem ceder espaço a outras novidades, como ao riso descontrolado diante de suas travessuras e de suas próprias mazelas.
Por falar em novidades, este ano quero ir a lugar diferente dos anos anteriores, irei aproveitar a beleza que esse tempo nos propicia ver, os abraços, os sorrisos, os fogos, a boa desculpa de nos reunirmos e festejar. Quero congratular a lembrança de que tudo isso pode ser bom: no fim, no começo e no meio. Alegrar-me por receber ótimas sugestões de leitores e por poder compartilhar minhas escritas com vocês. Agradeço a cada um que, mensalmente, devota seu tempo nesta leitura. Aos queridos participantes do grupo de estudos em psicanálise, obrigado por essa jornada. Que venha o NOVO todos os dias, que ele seja bem-vindo ou, como diz Lacan, “bem-dito” e não só ESPERADO.
(Artigo, originalmente, publicado no Jornal Folha de Varginha)
(*) Psicólogo e Psicanalista. Mestre em Psicologia (Psicanálise) pela Universidade Federal de São João Del-Rei, onde também contribuí como pesquisador. Especialista em Teoria Psicanalítica. Colaborador do Jornal Folha de Varginha e Blog do Madeira. Editor do site Janilton Psicólogo (www.janiltonpsicologo.com.br). Contato para atendimentos psicológicos (35) 3212 6663 / 9993 6663.
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