Elisabeth Almeida (*)
Tempos atrás nossas preocupações giravam em torno do fato de nossos filhos se drogarem. Era esse nosso medo.
Por que será que hoje tememos que eles se suicidem? É fato. Clínico há mais de 30 anos. Escuto diariamente a angústia de pais que pensam que seus filhos podem se matar por isso ou aquilo. E podem mesmo . E estão se matando mesmo. Sabemos disso. O que mudou para que a preocupação com as drogas se deslocar-se para a preocupação com a vida? O que mudou , qual o fator que se alterou para que drogar-se seja menos, seja pouco , e matar-se tenha adquirido prioridade no pensamento ou na intenção? Vários fatores. Destaco um. O suicídio é o ato derradeiro de destruição que uma pessoa pode fazer consigo mesma. Pergunto : por quê uma pessoa tira a própria vida? Suponho : O suicídio é a última resposta diante da impossibilidade de falar sobre o sofrimento que nos acomete. O que pode salvar uma vida é a palavra que faz laço com o outro e não contra o outro. O que pode matar uma vida é a palavra. A palavra dura, a palavra que desenlaça.
Tomemos o exemplo Bolsonaro . O discurso Bolsonaro produziu no próprio Bolsonaro uma agressão no seu corpo que poderia ter tirado sua vida. Produziu , num sujeito (o agressor) uma passagem ao ato que o exclui dos laços sociais. Marcado para sempre estará esse pobre sujeito frágil. Isso não foi suficiente para impedir, para conter Bolsonaro. Não . Ele pede mais e mais. Ele faz o gesto de portar uma arma na mão, ainda hospitalizado. E os filhos da nossa terra repetem o gesto em carretas e etc.
O efeito Bolsonaro está no registro da nossa agressividade . Da nossa brutalidade . Somos sim agressivos. Somos brutos . Melhor quando reconhecemos isso para nós mesmos .
Nossa brutalidade é também uma defesa conte a contra nossas angústias.
Defesa perigosa porque nos volta exatamente contra nós mesmos .
Bolsonaro ilustra isso com perfeição. Quase perdeu a vida .
Duro, encontrou a dureza.
Bruto, encontrou a brutalidade.
Nossos filhos:
Se endurecermos com eles sobre as escolhas sexuais, se patologizarmos a sexualidade deles, certamente se matarão. Não vão se drogar. Vão morrer.
Se endurecermos com eles nas escolas, impondo modelos arcaicos de funcionamento, vão se matar.
Se tivermos armas em casa , vão se matar.
Vão (EUA- Trump) nos ensinam isso) , vão atirar nos colegas com mais frequência do que já vem acontecendo. Nossos filhos morrerão em escolas , cinemas, shoppings, praças, morrerão nas mãos dos colegas.
Bolsonaro, junto com suas promessas de botar ordem na casa, porta além de armas nas mãos, um DIZER-DURO.
Esse é o problema.
O problema deixa de ser a corrupção. O problema passa a ser aquilo que se sucede a um DIZER-DURO.
Somos humanos . Somos frágeis, somos suscetíveis. Somos egoístas, tiramos proveito de tudo e de todos quando podemos fazer isso na permissão das nossas consciências. Todos cometemos pecados íntimos, inconfessáveis e negados, jogados embaixo dos tapetes.
Mas somos humanos . Responsáveis. Não é necessário nenhuma intelectualidade para sacar isso .
Responsáveis. Sempre . E somos seres sensíveis, antes de sermos inteligente.
Somos seres de linguagem . O DIZER-DURO não é sem consequência. Ele é portador da morte . Ele aciona a nossa pulsão de morte.
O DIZER-SENSÍVEL aciona nossa pulsão de vida , move nosso desejo, nos mantém nos laços afetivos.
Pela vida, sempre.
Pela palavra suave, sempre .
Pelos laços amorosamente construídos, sempre.
(*) Psicanalista. Membro da Escola Brasileira de Psicanálise de São Paulo. Atua em consultório na cidade de Varginha. Participou da 2ª Edição do Psicanálise em Diálogo.
(Texto, originalmente, publicado pela autora em seu perfil do Facebook)
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